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Larah transforma realidade social por meio do handebol

da redação - 27 de jun de 2025 às 14:51 136 Views 0 Comentários
Larah transforma realidade social por meio do handebol Da Redação

Aos 19 anos, Larah dos Santos Komatsu segue trilhando um caminho construído com esforço, fé e a promessa de abrir portas para outros jovens como ela. Natural de Chapadão do Sul, no interior de Mato Grosso do Sul, ela começou no handebol aos 7 anos, após acompanhar o pai em um jogo da equipe adulta. "O técnico era o Agnaldo e depois do jogo do adulto, deixava eu brincar um pouco com a bola. Eu me apaixonei, e queria ir todos os dias. Não sei dizer bem o motivo, porém eu me sinto em paz dentro da quadra com a bola", recorda.

Frequentando os treinos adultos, Larah teve a oportunidade de ver nascer uma nova categoria. "O Agnaldo me perguntou se eu queria que montasse um time feminino para eu jogar, e eu disse sim." A partir dali, a formação com foco em fortalecimento de base começou. Apesar das dificuldades técnicas e da inexperiência da equipe, os primeiros campeonatos foram fundamentais para o amadurecimento do projeto.

A trajetória de Larah está diretamente ligada a uma realidade marcada por limitações e resistência. "Éramos chamados de favelados e vilheiros. No handebol, era só a vila, por isso o recurso era sempre restrito e muitas vezes negado. O município preferia empregar os recursos no vôlei, tênis, por ser um público de classe média alta."

O projeto cresceu sob o comando de Adriano "Pão", que assumiu a iniciativa após Agnaldo sair. "Ele passou a ser meu técnico, onde o mesmo tinha mais habilidade em ensinar fintas. Fomos sempre estudando juntos sobre finta." A proposta se expandiu para escolas municipais e estaduais, abrangendo uma demanda formada principalmente por crianças e adolescentes em situação de vulnerabilidade social.

Muitos dos alunos não tinham sequer o que comer ou vestir. "O professor muitas vezes dava as roupas dele e tênis, comprava medicação, levava no médico e até tentava acompanhar na escola. Mas das aulas de handebol ninguém faltava, até mesmo porque pegava a hora do recreio da noite para poderem ter a alimentação da janta."

A própria família de Larah se envolveu profundamente com o projeto. "Meus pais eram uns dos que apoiavam, ajudavam sempre que podiam o professor e os atletas. Fazia rifa, pedia patrocínio, ajudavam a levar com transporte próprio para os campeonatos. Inclusive perdemos um carro em um acidente de capotamento, minha mãe indo ajudar a transportar o pessoal. Mas, mesmo assim, o time foi campeão”.

Esse comprometimento coletivo criou um ambiente de pertencimento e resistência, transformando o esporte em ferramenta de inclusão. "A garra fala mais alto que a necessidade de sobreviver ao descaso e à falta de recurso. O verdadeiro atleta nasce na realidade dura de não ter nada, porque o nada com pouco se torna tudo. Sabemos o valor de cada coisa conquistada."

Com o tempo, Larah passou a ser vista por equipes nacionais. "Comecei a ser escolhida por times para representar em campeonatos a nível nacional até que o clube português me viu pela primeira vez nos Jogos da Juventude de 2023." Foi a primeira etapa de uma nova fase na carreira.

Mesmo com as conquistas, ela afirma que o objetivo vai além das medalhas. "Meu foco é cumprir com a promessa que eu fiz para mim e para minha família de sangue e do handebol. Mostrar que de onde eu saí tem mais como eu, com o mesmo talento e garra." Ela cita nomes como Gustavo, hoje na Portuguesa e convocado para representar a seleção brasileira, e Aninha, atleta talentosa que teve o ligamento do joelho rompido sem acesso ao tratamento adequado.

"Temos várias Larahs, vários Gustavos, vários Luiz, várias Aninhas. Atletas excepcionais esquecidos por falta de uma ajuda, um tênis. E sei o valor disso, porque só se tem valor o que o dinheiro não pode comprar."

"Quero me tornar alguém que possa levar recurso para o meu técnico, para os meus irmãos do handebol, para a minha família FHC. Com a ajuda de Deus e muita fé, vou conseguir. Estou aqui por eles e creio que vamos nos tornar um clube grande, semelhante a esse que estou, o Portuguesa. Quero montar um clube para minha família FHC e dar oportunidades a todos lá."

O handebol, para ela, é mais do que um esporte. "É um futuro, tanto nos estudos quanto no esporte. E a obrigação de representar todos aqueles que não tiveram a mesma chance que eu tive."

Entre os momentos marcantes da carreira, Larah cita seu primeiro título brasileiro. "Foi ao lado de pessoas que eu admiro muito." Desde então, ela participou de competições como os Jogos da Juventude, os Brasileiros Escolares e os Campeonatos Brasileiros de Clubes. "A primeira vez que fui para um campeonato brasileiro foi no Rio de Janeiro. Ainda era cadete pelo time de Campo Grande. Fiquei chocada com o nível do handebol. Ali eu vi que, se eu quisesse chegar longe, ia ter que trabalhar muito."

A evolução veio com esforço. "Agarrei todos meus aprendizados, tanto erros quanto acertos." No mês de junho de 2025, Larah disputou o Campeonato Brasileiro de Clubes representando o clube Portuguesa. "Fomos campeãs e foi uma realização, de todo sonho e trabalho até aqui."

Sua rotina atual é composta por treinos específicos físicos pela manhã, academia de segunda a sexta e quadra de segunda a sábado. Em 2026, ela pretende iniciar o ensino superior com uma bolsa conquistada graças ao esporte. "Conseguir me formar na faculdade através do handebol, conseguir através de muito trabalho ser digna de ir para uma seleção brasileira adulta e participar de uma Olimpíadas" são seus principais sonhos como atleta.

Questionada sobre as dificuldades enfrentadas, especialmente por ser jovem e mulher, Larah relata episódios de preconceito. "Já houve situações onde me falaram que esse esporte não era para mulheres, que eu não iria chegar em lugar nenhum. Que essas mesmas pessoas estariam lá para assistir minha derrota. A primeira coisa que fiz foi entregar para Deus, porque não conheço meu amanhã e meu futuro é somente Ele quem decide."

Ela afirma que, diante das críticas, decidiu trabalhar ainda mais. "Comecei a trabalhar ainda mais para conquistar meu lugar no handebol e ainda estou nessa caminhada."

A fé sempre esteve presente em sua jornada. "Eu acho que não só no esporte, mas na vida, escolha bem as pessoas que vão andar contigo nessa caminhada. E mesmo se não tiver ninguém, entrega sua vida para Deus e trabalha muito, muito mesmo, que a recompensa vem. Deus nunca falha."

Larah sabe que hoje é referência para muitas meninas. "Eles me veem como uma ídola e dizem se inspirar em mim, e necessito fazer isso valer a pena." O sonho de transformar sua história em uma ponte para outros segue vivo. "Quero que outros também tenham a chance que eu tive. Se sou diferente, é porque de onde eu saí, há diferença dentro do handebol."

Ela finaliza com uma frase que a acompanha e dá força nos momentos difíceis: "O meu corpo e meu coração poderão fraquejar, mas Deus é a força do meu coração e a minha herança para sempre."

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