Encontro Estadual de Capoeiristas leva mestre do esporte a Corumbá
Corumbá (MS) - Durante o último final de semana praticantes da capoeira em várias cidades de Mato Grosso do Sul se reuniram em Corumbá para o I Seminário Estadual de Capoeiristas. O evento aconteceu no pátio da Casa de Cultura Luiz de Albuquerque (ILA), tendo como principal destaque a presença do mestre Suassuna, um dos mais respeitados nomes do esporte e um dos fundadores do grupo Cordão de Ouro.
Para Lamartine José dos Santos, conhecido no meio da capoeira como contramestre Pernambuco, a realização de um evento como esse mostra uma nova fase do esporte na cidade. "É quebra de paradigmas.
A capoeira era vista como uma marginalização aqui no município, não posso negar, houve diversos problemas, mas hoje a capoeira está num patamar muito bom.
A Prefeitura mesmo está dando apoio ao segmento dos capoeiristas aqui. É o fortalecimento de uma arte, de um esporte, de uma cultura que nós praticamos", disse ele que é responsável pela implantação do grupo Cordão de Ouro na cidade.
Entretanto, não se esquece de citar demais grupos que, juntos, são responsáveis por colocar dentro do esporte cerca de 650 pessoas, entre homens, mulheres e crianças.
"A capoeira em Corumbá levou bastante tempo para evoluir até pelo fato de ser um estado novo. O mestre Mato Grosso foi o primeiro a trazer a capoeira para o estado de Mato Grosso do Sul, daí vieram diversos alunos como mestre Negrande, Jamaica e outros tantos.
Hoje, a capoeira em Corumbá está num nível muito bom principalmente na parte pedagógica. São 3 grupos na cidade: Instituto Cordão de Ouro, Grupo Libertus e Liberdade dos Negros", elencou.
Além dos praticantes do esporte, o evento reuniu professores e vários convidados da sociedade civil como o Instituto Madê Korê Odara e Acorema, entidades voltadas para o fortalecimento da cultura afro-brasileira, a qual está vinculada a prática da capoeira.
Palavras de mestre
Natural da cidade de Itabuna, na Bahia, mestre Suassuna tem seis décadas dedicadas à capoeira. Hoje, com 73 anos de idade, ele tem escolas e grupos espalhados por todo o território nacional e exterior e avaliou a situação da capoeira em Corumbá.
"A capoeira aqui está maravilhosa, está igual a do Rio, São Paulo. Percebi também a dificuldade que não é somente de Corumbá. A cultura de uma forma geral tem essa dificuldade, embora exista a secretaria de cultura, mas eu fiquei muito otimista em ver esse trabalho aqui", disse em entrevista ao Diário.
Ele, que possui academias do Grupo Cordão de Ouro, em 50 países, explica que a capoeira conquistou o mundo graças a cada praticante que levou o som do berimbau e o gingado do misto de dança e luta.
"O capoeirista com suas poesias, com seus berimbaus, com seus cânticos, foi conquistando o mundo. Nenhuma autoridade no Brasil goza desse privilégio de dizer que a capoeira conquistou o mundo pelo Governo dele, pela Secretaria dele.
O capoeirista conquistou na raça com seu berimbau, com seus pés descalços, com sua sandália viajando o mundo todo. Nós temos capoeira no mundo todo: no Japão, na Rússia, na Alemanha", disse.
Em oposição a essa disseminação do esporte, mestre Suassuna faz um alerta para que o Brasil incentive mais aquilo que lhe é autêntico. "Nós, no Brasil precisamos apoiar muito porque estamos perdendo espaço para estrangeiros.
Já tem estrangeiros dando aula de capoeira no Brasil. Estrangeiros já me ajudaram a me dar aula: pessoal do Israel, da Inglaterra. A capoeira, antes, era um privilégio baiano, depois virou um privilégio de São Paulo, Rio, Minas, Paraná.
Hoje, ela não é privilégio nem somente do Brasil, tem mais de 200 países fazendo capoeira. As universidades nos Estados Unidos me pedem uma média, por ano, de 8 a 10 professores, enquanto no Brasil, existe uma resistência até nas escolas contra a capoeira", comentou ao afirmar que a prática da capoeira leva mais do que a técnica do esporte, leva também a cultura brasileira.
Olimpíadas
Mestre Suassuna avaliou também a inserção da capoeira como um esporte olímpico, questão que está gerando debate há certo tempo. Na opinião dele, esse trabalho deve ser muito bem discutido, pois acredita que uma padronização como exigem as regras de competição, tire aquilo que considera a maior característica da capoeira.
"Precisa de muita organização, muitas definições dos mestres: o que é que é, o que é que vale, não vale, pelo fato de termos muitas linhas de trabalho na capoeira, existem muitos pensamentos na capoeira. Eu tenho minha dúvida com relação a isso porque quando ela for competitiva, para jurados olharem, perde a espontaneidade do capoeirista, a criatividade: a grande marca da capoeira.
Se for nas Olimpíadas, vai ter um padrão, vai formatar algo que depende dessa característica e quem vai julgar são pessoas que nunca deram uma aula na vida", ponderou.
Democrática e educativa
Ao colocar homens, mulheres de diferentes idades numa mesma roda e aula, o grupo Cordão de Ouro prova que a capoeira é democrática e só existe pelo respeito ao outro.
"Trabalha com a cidadania, contra a discriminação porque todos jogam juntos: homens, mulheres, crianças. Ainda existem grupos que dizem que certas pessoas pelo tipo físico, força, falam que aquela pessoa não serve. O trabalho da capoeira Cordão de Ouro é de cooperativismo, cada um coopera com o outro, se você sabe ensina pra ele e ele pro outro, e fazemos uma corrente de conhecimento", disse.
Ele exaltou o poder transformador do esporte e explicou que os valores salutares de uma sociedade podem ser aprendidos no dia a dia da prática. Suassuna repudiou aqueles que desvirtuam o real propósito do esporte.
"O esporte bem dirigido, educa, Tem muita gente ensinando capoeira, jiu-jítsu para brigar em boate, essa coisa toda, mas o esporte em si educa mesmo. Que todos pratiquem esporte, estudem, tenham responsabilidade por aquilo que estão fazendo, respeitem a arte da capoeira, do judô, do karatê.
Quem não é cidadão é aquele que não respeita ninguém. Você sozinho não é capoeira, tem que ter o parceiro, o coletivo, por isso essa parceria, esse respeito pelo outro", finalizou.
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