Bate-Bola | Rosália Silva/Da redação | 06/02/2009 14h39

Bate-Bola: Cristiano Lourenço

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Cristiano Lourenço

Há dez anos no bairro Dom Antonio Barbosa, em Campo Grande, os próprios moradores tiveram a idéia de montar uma escolinha de futebol. Cristiano Lourenço da Silva, 43 anos é um dos idealizadores dessas atividades que atualmente reúnem três vezes por semana mais de cem crianças.

Criada em 1998 a Escola de Futebol Comercial JC, devido às necessidade que enfrentou, passou a ser denominada Escola Real, por ser uma entidade já registrada e regularizada junto à Federação. Para conhecer melhor o trabalho e saber o que estava acontecendo, a equipe do Esporte Ágil foi até o bairro, uma das comunidades mais carentes da Capital.

Lutadores, Cristiano, que é vice-presidente da Escola Real, e a esposa dele Jaqueline buscam várias maneiras de manter a escolinha em funcionamento. Segundo eles, o objetivo sempre foi oferecer uma atividade esportiva e retirar das ruas as crianças do Bairro Dom Antonio Barbosa e região. No dia em que o Esporte Ágil foi ao bairro conhecer o projeto, o campo que recebe a garotada estava há quatro meses com as grades fechadas e as traves do gol jogadas no chão. De acordo com eles, a Associação de Moradores fechou o local alegando reformas, o que até agora não aconteceu. Entre os dias 10 e 15 de fevereiro, está previsto o retorno das atividades da escolinha e a responsável pela Associação não foi localizada para comentar os fatos.

Para dificultar mais as aulas, o professor Geraldo, que era o responsável pelo treinamento e participação dos atletas nos torneios, faleceu no fim de 2007. Sem professor com o Cref em 2008, foi um ano de vacas muito magras no projeto, já que ficaram sem recursos e sem professores por oito meses, mas passaram a má fase com muito esforço.

Segundo a Funesp (Fundação Municipal de Esporte) até o período em que o local era denominado Escolinha JC eles tinham apoio da Fundação. E, para este ano, só em março estará definido quais serão as escolinhas que entrarão no rol das atendidas pelo Atletas no Futuro. A Funesp informou que ano passado naquela região funcionavam três escolinhas do Atletas no Futuro: duas de futebol e uma de judô. Portanto, a escolinha administrada por Cristiano não fez parte em 2008 das atendidas pela Fundação.

Esporte Ágil - Como vocês começaram e de onde são as crianças que vocês atendem?
Cristiano - Aqui a gente atende Dom Antonio Barbosa, Parque Lageado, Parque do Sol, e Vespasiano Martins. Porque essa região é muito carente na área de esporte. Não tem atividade nenhuma. Para começar não tem uma praça, não tem um centro comunitário. O que tinha quando mudamos para cá, há dez anos, era o campo de futebol sem ser gramado. A gente tem aí ofício enviado para o então prefeito André Puccinelli, para os vereadores, para conseguir que o campo fosse gramado. Devido à necessidade das crianças, por ser um bairro de baixa renda. E a gente vem lutando faz dez anos.

Esporte Ágil - Quantas crianças são atendidas hoje?
Cristiano - Em torno de 120 crianças, desses quatro bairros da região. Aqui não tem crianças que vem de outros bairros ou do centro. Nas nossas atividades aqui, não cobramos nada de ninguém. É mais para atender, especificamente, as crianças aqui do Dom Antonio Barbosa. Só que agora, como a gente de dois anos para cá, passou a se chamar Escola de Futebol Real, com CNPJ, nada impede de futuramente se criar um time de futebol profissional. Porque atleta, de capacidade, que gosta do esporte, aqui tem. Só faltam mais incentivos dos órgãos públicos. Dos governantes, prefeitos, governador apoiarem mais, devido aqui ser um bairro de poder aquisitivo muito baixo.

Esporte Ágil - Quantas crianças já passaram por aqui nestes dez anos?
Cristiano - Já passou mais de trezentas crianças. Hoje a gente tem atleta que passou por aqui que são casados ou se amigaram. E que com as atividades daqui, se tornaram cidadãos de bem. Hoje eles têm filhos que estão na escolinha, têm atletas que se tornaram profissionais, jogaram no Coxim e foi campeão. Hoje joga no Corumbaense, que é profissional. Então, passou mais de trezentas crianças, que hoje são jovens, adultos. Tem campeonato amador que a gente já participou, que era com garotos do projeto até 16 anos, nós disputamos aí no Parque do Sol quatro campeonatos sem perder um jogo.

Esporte Ágil - Como as crianças fazem para se inscrever no projeto?
Cristiano - Para se inscrever, as crianças têm que estar estudando, tem que apresentar o comprovante de que estuda. O pai, a mãe ou avó, alguém que é responsável, vir assinar a responsabilidade, de que está deixando no projeto. Quem estuda de manhã, vem à tarde. Quem estuda de tarde, vem de manhã treinar.

Esporte Ágil - Elas pagam alguma coisa?
Cristiano - Não, não pagam nada. É isso que eu falo, tem muitas escolinhas por aí, que cobram de trinta e cinco a cinquenta reais de mensalidade. Aqui nós nunca cobramos nada, porque não tem nem como cobrar, porque as crianças não tem como pagar.

Esporte Ágil - Vocês estão em uma área de pobreza, tem o lixão que está próximo e que traz toda uma visão da sociedade sobre o bairro. O que vocês tentam passar para as crianças através do esporte?
Cristiano - O que a gente passa, não é que todos vão ser profissionais no esporte. Mas é um meio das crianças fazerem uma confraternização entre bairros. Porque falar que é do Dom Antonio Barbosa, Lageado ou Parque do Sol, a discriminação é muito grande. A gente passa que tem que aprender a conviver no esporte como parente, como amigos. Não ter rixas de bairros, porque esse é do Dom Antonio e do Lageado e tem aquele problema de gangue daqui e dali. Passamos para eles que tem que aprender a conviver com o ser humano, seja deste bairro, seja de outro. Jogar não com a finalidade de só ganhar, mas de participar do campeonato, do jogo, não para ter briga, mas para ter confraternização.

Esporte Ágil - As aulas estão com previsão de começar agora dia 10 de fevereiro e estou vendo que o campo está com as traves está toda desmontada. O que está acontecendo?
Cristiano - A questão é que estávamos de férias estamos pretendendo voltar agora dia 10 de fevereiro, pois do recomeço do ano letivo das escolas, e a única coisa que temos no bairro de esporte é esse campo de futebol. Não sei qual motivo, porque sim, porque não, desde o dia primeiro de outubro, a presidente do bairro, que se chama Vera Marques, veio até o campo, arrancou as traves. Está com quatro meses, disse que ia fazer reformas, construir vestiários, filmou aí, e até hoje não foi feito nada. E segundo boato do povo ela não vai abrir o campo para as crianças jogarem. Eu gostaria de saber das autoridades, dos vereadores, deputados, prefeito, advogados, se tem essa lei da Funesp, o órgão que representa, será que esse campo vai permanecer fechado, ou vai ser aberto para as crianças usufruírem desse campo. Outro dia eu vi uma reportagem do batalhão da polícia aqui no bairro Los Angeles e eu vi o presidente de lá implorando para ter uma área de lazer, que seja feito um campo de futebol. Agora eu pergunto, fazer um campo para ficar fechado da forma que está fechado este? É viável? Quanto se gastou para fazer esse campo e se a presidente de bairro tem o direito de manter ele fechado.

Esporte Ágil - Até dois anos atrás, vocês contavam com o professor Geraldo, que faleceu em 2007. Com a perda dele, como vocês se organizaram, sem ter um professor regularizado junto ao CREF?
Cristiano - Depois que o Geraldo faleceu, esse ano de 2008 foi muito difícil. Porque o Geraldo faleceu dia 28 de dezembro de 2007. A gente ficou com uma dificuldade muito grande, porque ele é quem tinha feito o curso pela Funesp, uma capacitação da qual ele tinha o CREF. Que é um curso que se profissionaliza na área de futebol de campo. Com a morte do Geraldo a dificuldade foi muito grande em 2008, porque não conseguíamos um outro professor que tivesse o CREF e a Funesp não liberava um outro. Até que no mês de setembro,  conseguimos o professor Hudson, que é formado em educação física, para nos auxiliar aqui. E a dificuldade de 2008 foi grande, porque a Funesp não cedia bola, material esportivo, colete. Não cedeu nada, nada. Foi ceder o professor Hudson agora no fim do ano, já em setembro. Aí, o professor Hudson começou, no dia primeiro de outubro, a presidente do bairro, e isso eu acho que não pode acontecer, fechou o campo. Isso, ela já tinha fechado antes. Fui no SBT, chamamos a imprensa, mostramos os meninos treinando aqui fora. Chamaram o senhor Carlos Alberto, que era o presidente interino da Funesp, que ajeitou e abriu o campo de novo. Só que a partir do dia primeiro de outubro de 2008 o campo foi fechado de novo. Só que a partir do dia primeiro de outubro de 2008 o campo foi fechado novamente. Hoje é primeiro de fevereiro, está há quatro meses fechado. Segundo a presidente ia ser para reformar o campo e até agora não foi feito nada. 

Esporte Ágil - E quais os planos para este ano?
Cristiano - Para este ano, tem muito vereador novo que entrou, e que disse que teve votos aqui no bairro e que iria trabalhar pelo bairro, ia ajudar a beneficiar. Agora eu quero saber é do campo, a principal dificuldade nossa hoje é o campo. Como vamos começar as atividades, sendo que a gente mora em frente ao campo de futebol, aqui tem banheiro, tem bebedouro, tem computador, tem livro. E ter que se deslocar daqui, que é um campo gramado perto do Ceinf ou lá no Parque do Sol. Não é justo isto acontecer. Eu acho que as autoridades, os vereadores, o secretário e o prefeito têm que tomar conhecimento para que não seja preciso reunir os pais dessas crianças e parar ônibus aqui. Porque o Dom Antonio já é discriminado, vão falar que é vandalismo. Mas a gente está no direito da gente, porque a única atividade que tem aqui no bairro é esse campo. Onde está o Conselho Tutelar, os direitos de ir e vir da criança, do adolescente e dos idosos de andar no campo de futebol, para a presidente fechar o campo. Eu gostaria de ouvir da OAB, de um advogado, promotor, juiz, secretário, vereador, se vai ter algum disponível para vir nos defender. Eu deixo o meu telefone, que é o 9989-5878. O endereço aqui é Rua Anselmo Selingard, 1261, no Dom Antonio Barbosa, porque não é justo. Se a presidente não liberar esse campo, vamos ter que nos reunir, fazer abaixo-assinado, parar ônibus, chamar prefeito, secretário, primeira-dama. Porque segundo informações ela fecha o campo porque tem ordem do prefeito, da primeira-dama. Será que é justo isso? O Único lazer das crianças é o campo de futebol. Estão falando em trazer a Copa do Mundo, a sub-sede aqui para Campo Grande, e como deixam fechar o campo, se foi feito para as crianças carentes do Dom Antonio Barbosa. Aqui não tem só bandido, aqui tem gente de bem. Não é que vive do lixão, trabalha no lixão para sobreviver. Acontecer isso com o campo de futebol, é injusto, tem que acontecer alguma coisa para ser revolvido este problema.

 

 


 

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