Kobe (Japão) - No Campeonato Mundial feminino, o maior obstáculo do Brasil não serão as rápidas chinesas. Muito menos as fortes cubanas ou as gigantes da Rússia. Apesar da história de sucesso da seleção, a torcida sempre desconfia: toda vez que o time nacional chega como favorito a uma grande competição, algo dá errado e a taça escapa. Foi o que aconteceu nas Olimpíadas de Atenas, por exemplo. E é exatamente para acabar com isso que as brasileiras evitam falar em favoritismo na disputa, jamais vencida pelo país.
Os números insistem em apresentar a equipe de José Roberto Guimarães como principal candidata ao título. Este ano, foram quatro títulos em quatro torneios disputados (Montreux Volley Masters, Torneio de Courmayeur, Copa Pan-americana e Grand Prix). Sem contar o fato de o time ter perdido apenas uma vez no ano: 3 a 2 diante de Porto Rico na Copa Pan-americana. Justamente o adversário da estréia brasileira no Mundial, na madrugada desta terça-feira.
Exatamente para evitar novas decepções que o favoritismo é visto com preocupação pela comissão técnica e jogadoras do Brasil. "No último Mundial de basquete feminino, falou-se muito nos Estados Unidos, mas as norte-americanas perderam a semifinal para a Rússia e acabaram em terceiro lugar", exemplifica o técnico José Roberto Guimarães. "Não estamos à frente das rivais, mas entre as equipes que têm chances de conquistar o título, assim como China, Cuba, Rússia e Itália", complementa, modesto.
Ele aponta os maiores perigos das seleções estrangeiras. "A base de Cuba é a mesma que conquistou a medalha de bronze nos Jogos Olímpicos de Atenas. A China passa por uma renovação natural, mas tem no time titular cinco jogadoras que foram campeãs olímpicas. Já a Rússia conta Sokolova, Gamova e Godina. Nos Estados Unidos, a Keba (Phips) parou de jogar, mas as outras jogadoras estão aí. E a Itália vem com o mesmo time que ganhou o último Mundial", descreve.
O discurso do técnico não é apenas para a imprensa. De acordo com a oposto Sheilla, Zé Roberto fez o máximo para que as jogadoras mantivessem o foco no Mundial. "Ele fala para nós que não há favorito absoluto. E todas as jogadoras estão tranqüilas quanto a isso, pois qualquer errinho pode decidir uma partida. Os times estão equiparados", analisa.
O treinador, inclusive, não concorda com o companheiro de profissão Bernardinho, que disse considerar a atual seleção a de maior potencial na história. "Acho que o time de 1996 também tinha um grande potencial. Este grupo ainda tem de provar seu valor", despista.
Por isso, a rotina de treinos específicos para a competição foi intensa. Durante quase um mês, as jogadoras treinavam de segunda a sexta no Centro de Desenvolvimento de Voleibol da CBV, em Saquarema. Lá, o dia começava às 9 horas com duas horas exercícios físicos e uma hora e meia de treinos com bola. Depois do almoço as atletas ganhavam um descanso até às 17h30, quando começava os treinos táticos, focados principalmente nos contra-ataques, que podiam durar mais outras três horas.
"A idéia era assimilar duas coisas: a técnica que o Brasil já possui naturalmente com a força física. Mudamos também alguns aspectos do nosso jogo porque sabemos que o Brasil tornou-se uma equipe muito visada. O Zé queria algo diferente para surpreender", revela a capitã Fofão, que não reclama da carga horária puxada. "O voleibol agora exige muita repetição e um bom trabalho de técnica. Tudo acontece muito rápido no jogo", explica.
De acordo com ela, outra arma brasileira é o excelente clima entre as atletas. "É uma filosofia que o Zé implantou na equipe: "Não temos uma estrela, mas sim várias". Todas têm a oportunidade de ser titular, então a cada dia buscamos nos dar ao máximo porque sabemos que quem estiver bem vai sair jogando", explica.
Melhor jogadora do Grand Prix 2006, Sheilla embasa as palavras da colega. "Uma das coisas mais legais da seleção é o relacionamento. As meninas estão rindo o tempo inteiro. Estamos desde maio juntas, mas parece que nos encontramos. Acho que essa é a força do grupo", aponta a atleta, que só promete uma coisa: vibração não vai faltar. "Nós temos que continuar assim: crescendo, treinando bastante, correndo atrás dos torneios que a gente não tem, como as Olimpíadas e o Mundial. Ainda não chegamos a lugar nenhum, mas estamos no caminho certo", acredita.