40º no ranking nacional, Operário vive sem sede e com problemas

da redaçao/com globoesporte.com - 6 de jul de 2011 às 12:57 298 Views 0 Comentários
40º no ranking nacional, Operário vive sem sede e com problemas

Campo Grande (MS) - De que é feito o sucesso de um clube de futebol? Muitas conquistas, um símbolo forte, um templo, várias histórias para contar. Precursor dos pequenos a assombrar os grandes no Brasileirão - foi terceiro colocado em 1977 -, o Operário, atual 40º no ranking de clubes da CBF, que já teve no elenco estrelas como o lendário Manga - goleiro da Seleção Brasileira na Copa de 1966 -, viu ao longo dos anos esse patrimônio esvair-se em disputas judiciais ou apenas sumir, misteriosamente. A sede social foi leiloada e já não existe mais. A marca acabou tomada pela Justiça para quitação de dívidas. Dos principais troféus, nem a diretoria tem notícias. Para piorar, o clube foi, recentemente, suspenso por dois anos de competições estaduais pela Federação Sul-Mato-Grossense.

A diretoria tenta manter o time e superar as dificuldades para mudar o presente. A torcida, por conta própria, procura resguardar o passado com a criação de um memorial com painéis, fotos e materiais sobre a história do Operário, que, além do terceiro lugar em 1977, foi quinto em 1979 e sétimo em 1981.

Agora, a realidade é outra. A sede que ficava na Avenida Bandeirantes, no bairro de mesmo nome, teve de ser liquidada em 2005 por R$ 16,5 mil para ajudar no pagamento das despesas do clube. O prédio foi demolido, e hoje o terreno dá lugar a uma revenda de veículos usados. Atualmente a equipe usa o campo do Sindicato dos Bancários de Campo Grande para treinar. A poliesportiva, CT operariano que fica no bairro Vila Popular, precisa de reformas nos vestiários e foi preterida este ano.

O presidente do Operário, Toni Vieira, afirma que a perda da sede foi resultado de má administração num período em que a associação esportiva era controlada por uma sociedade anônima. A parceria do clube-empresa, iniciada em novembro de 1999, foi desfeita em 2006 e não resultou em nenhum título.

A marca Operário Futebol Clube também foi "arrematada" judicialmente no fim do ano passado em uma ação movida pelo ex-zagueiro Celso Elias Zottino, capitão do time no título do Módulo Branco de 1987. Ele obteve na Justiça trabalhista a adjudicação da marca, ou seja, seria proprietário do símbolo sem o ônus das dívidas contraídas em nome do clube.

Apesar do resultado do processo, o time usou sem problemas o nome Operário para disputar o Campeonato Estadual deste ano. O dirigente não reconhece a validade da decisão da 3ª Vara do Tribunal Regional do Trabalho e diz que vai recorrer porque a marca não seria passível de patentear. O próprio clube já havia tentado registrar o nome junto ao Instituto Nacional de Propriedade Intelectual (INPI), mas o pedido foi negado.

- Existem dezenas de Operários pelo país, e o direito de registrar essa marca não pertence a ninguém. O nome é de domínio público - afirmou Toni Vieira.

Embora o Operário-MS seja campeão no país por dois estados, Mato Grosso e Mato Grosso do Sul - ao lado do Comercial -, o clube não consegue contar essa história por meio dos troféus. Isso porque as taças provavelmente não existam mais. A atual diretoria alega não saber o paradeiro da maioria do acervo de títulos.

Entre eles, o único troféu internacional conquistado pelo Operário: a President's Cup em junho de 1982. O time foi convidado pela Coreia do Sul para um torneio que tinha o objetivo de desenvolver o futebol naquele país. Para chegar à final, o alvinegro campo-grandense enfrentou as seleções da Malásia e da Tailândia, o Hallelujah-COR, o Bayer Leverkusen-ALE e o PSV Eindhoven-HOL. Um empate sem gols contra a seleção anfitriã garantiu a conquista do título histórico.

Também não há notícias sobre as taças do Módulo Branco da Copa União 1987 e do último campeonato estadual vencido em 1997 (veja no vídeo ao lado). Atualmente, o acervo conta com apenas um troféu de copa amadora, algumas placas comemorativas e a taça da conquista do segundo turno do Sul-Mato-Grossense de 2007 e da Copa Campo Grande.

Garra, amor e tradição

O representante da torcida Garra Operariana, Sílvio Eduardo, é crítico em relação à atual diretoria e defende a substituição dos mandatários do clube. Ele conta que a torcida mantém à própria custa um acervo de painéis, fotografias e materiais sobre a história do clube, e não recebe apoio dos dirigentes. O memorial foi criado em agosto de 2009 pela ocasião do aniversário de 71 anos do Operário e divide espaço com a sede da torcida, que fica no centro de Campo Grande. Apesar de pequeno, o local ajuda a manter viva a história de conquistas do alvinegro.

Mas há também operarianos que nutrem carinho e devoção pelo clube, independentemente da fase em que se encontra ou dos problemas administrativos. O artista plástico Sullivan Gonçalves de Oliveira, 35 anos, ganhou fama entre a torcida como o mascote Galo Lutador.

A paixão pelo alvinegro o levou a criar o personagem há quatro anos. Ele elaborou uma fantasia para acompanhar os jogadores em campo e animar a torcida nos jogos do Operário.

"Não tem como explicar a emoção que é ser mascote. Jamais ganhei nada para estar lá. Eu era agraciado por andar com o time. A mascote é o elo da torcida com o clube, nunca se pode deixar  isso esmorecer. Porque o que você faz dentro da fantasia reflete em cada torcedor".

Um problema de saúde causado por um acidente automobilístico afastou temporariamente a mascote dos gramados este ano, mas não diminuiu o amor de Sullivan pelo clube.

"O Brasil inteiro tem carinho pelo Operário. Um time que nasceu pequeno e deslumbrou o mundo foi o primeiro a derrubar os grandes. Telê Santana dizia ter medo de enfrentar o Operário. Essa história não vai se apagar jamais".

A força do interior

O Operário foi o precursor dos times pequenos a assombrar os grandes no Campeonato Brasileiro, trajetória seguida nas décadas seguintes por Bragantino, São Caetano e tantos outros. Em 1977, o alvinegro de Campo Grande (que não era capital de fato, pois Mato Grosso estava em pleno processo divisionista) conquistou o terceiro lugar na competição, deixando para trás Fluminense e Palmeiras (confira os gos no vídeo ao lado) na fase decisiva.

Um dos protagonistas da época áurea é Luís Carlos Pereira Andrade, o Baianinho, que foi revelado pelo clube em 1975 e teve passagem pelo Corinthians em 1981. Hoje, aos 53 anos, o ex-jogador, que atuava na ponta direita, comanda uma escolinha em Campo Grande. Ele conta que a boa infraestrutura do clube permitia que o elenco desse resultados positivos em campo.

"Tinha escolinha, alojamento, alimentação para os jogadores. O pagamento nunca atrasava. A diretoria exigia resultados, mas ao mesmo tempo dava condições. Naquela época a gente era time grande do país e fazia por merecer".

Baianinho recorda com orgulho de uma das escalações operarianas: Manga, Paulinho, Silveira, Biluca e Escurinho; Tadeu, Edson e Marinho; Roberto César, Everaldo e Peri. Quem comandava o escrete era o saudoso Carlos Castilho, que, além de ser considerado o maior goleiro da história do Fluminense, teve sua passagem pelo Operário imortalizada como treinador  após o desempenho de 1977.

Naquele ano, a campanha inesquecível do Alvinegro terminou com dez vitórias em 20 jogos. Contra o Palmeiras, o maior público da história do Estádio Morenão: no dia 23 de fevereiro de 1978, o Operário venceu por 2 a 0, com gols de Everaldo e Tadeu, diante de 38.122 pagantes. O primeiro confronto da semifinal entre São Paulo e Operário arrastou 103 mil pessoas ao Morumbi, recorde daquele ano. Serginho Chulapa liderou a vitória tricolor por 3 a 0 (veja no vídeo ao lado). No jogo de volta, o alvinegro caiu de pé com vitória de 1 a 0, gol marcado por Tadeu.

Outras campanhas destacadas do Alvinegro foram o quinto lugar em 1979 e o sétimo em 1981, quando sofreu a eliminação nas quartas de final para o Grêmio, campeão daquele ano. O Operário manteve-se ativo na primeira divisão e só ficou de fora em dois torneios entre 1980 e 1986, último ano que esteve na elite. Naquela época, o desempenho no campeonato estadual do ano anterior valia vaga para o Brasileirão do ano seguinte.

Em 1987, com a Copa União, o alvinegro sagrou-se campeão do Módulo Branco, torneio equivalente à terceira divisão brasileira. O título garantiu permanência na segundona em 1988. O clube rondou as divisões de acesso nos anos de 1990, mas nunca mais conseguiu voltar à elite. Em nível regional, o último título foi o bicampeonato sul-mato-grossense em 1996 e 1997.

Campanha para esquecer

O ano de 2011 para o Operário foi marcado por uma campanha pífia no estadual (duas vitórias em 14 jogos) e vários incidentes extracampo que entristeceram a torcida alvinegra.

O atacante Marco Antônio, de 36 anos, assumiu o comando da equipe após uma série de cinco derrotas consecutivas. Àquela altura, faltando quatro rodadas para o fim da primeira fase, evitar o rebaixamento já estava difícil porque o time rondava a zona da degola. A missão do atacante-treinador ficou praticamente impossível quando o Operário foi punido pela Federação de Futebol com a perda de seis pontos na tabela por escalação irregular do zagueiro Reinaldo. A entidade argumentou que o atleta havia recebido três cartões amarelos antes de atuar contra o Chapadão-MS, em partida válida pela 11ª rodada da primeira fase.

Em maio, a diretoria procurou o Ministério Público Estadual para denunciar supostas irregularidades de dois adversários, o MS Saad e o Aquidauanense. A reação da Federação foi imediata: suspensão das competições oficiais por dois anos. Segundo a entidade, o Operário-MS contrariou o regulamento ao procurar a Justiça comum para solucionar conflitos.

Restou a Marco Antônio a melancolia de conduzir o elenco até o fim do campeonato. Ele conta que os fatores externos causaram abatimento entre os atletas.

"Mesmo com tudo o que aconteceu, os meninos jogaram como profissionais, não fizeram corpo mole. Era o nome deles que estava em evidência naquela hora".

Se o time não ia bem em campo, a torcida também não comparecia em grande número aos estádios. Em cinco jogos como mandante em Campo Grande, o Operário-MS vendeu 636 ingressos e arrecadou pouco mais de R$ 5,8 mil. Nem o clássico contra o arquirrival Comercial-MS foi capaz de mobilizar os operarianos. A partida atraiu 112 pagantes ao estádio Jacques da Luz no dia 24 de abril.

Planos para o futuro

Enquanto tenta mudar nos bastidores da bola a decisão que suspendeu o time de competições oficiais em Mato Grosso do Sul por dois anos, o dirigente operariano elabora um plano ambicioso para os padrões do futebol estadual. Toni quer lançar em breve o projeto "Sou Operariano Mesmo" para converter torcedores em sócios.

Haverá quatro modalidades diferentes (bronze, prata, ouro e diamante) que oferecem vários benefícios, desde brindes e descontos no ingresso até direito a voto nas decisões do clube.

"Já temos um sócio com título diamante, que é o mais valioso. De toda a venda de títulos, 30% irão para o pagamento das dívidas trabalhistas e os outros 70% serão investidos diretamente no clube" prometeu Toni. É esperar para ver.

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