Aos 16 anos, a douradense Ane Gabriely Loza tem feito do karatê não apenas um esporte, mas um caminho de disciplina, superação e conquistas expressivas. Em pouco mais de três anos de dedicação, a atleta já acumula nove títulos estaduais, dois sul-americanos e um título brasileiro, competindo nas modalidades kata (técnica) e kumite (luta). Com rotina exigente e pouca margem para descanso, Ane representa uma nova geração de atletas que equilibram os desafios do esporte de alto rendimento com os estudos e o cotidiano de uma adolescente.
Nascida em 09 de novembro de 2008, em Dourados (MS), Ane começou no karatê aos 12 anos, influenciada pela mãe. “Iniciei no karatê sob incentivo da minha mãe, que sempre praticou esportes”, lembra. A decisão de entrar no tatame veio acompanhada de uma série de mudanças na rotina, mas também de um propósito maior. Desde o início, sua trajetória foi marcada por treinadoras mulheres, o que contribuiu diretamente para sua motivação e identificação dentro da modalidade.
O primeiro grande título estadual foi um divisor de águas. “Foi uma sensação única de superação e muita resiliência, pois o esporte individual e em uma categoria feminina enfrenta grandes dificuldades”, afirma. Ane destaca que, além do mérito esportivo, o título teve um peso simbólico: “Representar uma academia formada e liderada por mulheres, minha shihan dai Elaine e a sensei Carolina, é algo muito especial. São pessoas que sempre me inspiraram a dar o meu melhor enquanto pessoa e atleta”.
Ela reconhece que não imaginava chegar tão longe tão rápido. “As dificuldades são muitas. Conciliar estudos, treinos, musculação e outras atividades acaba sendo um desafio. A falta de incentivo também coloca à prova qualquer atleta que busca o seu melhor”. Mesmo assim, com o apoio familiar e das treinadoras, Ane encontrou motivação para persistir.
Entre as conquistas, os dois títulos sul-americanos ocupam lugar especial. Em 2023, ela venceu no kata em Santa Cruz de La Sierra, na Bolívia. Em 2024, veio a consagração no kumite, em Barueri (SP), em um torneio que reuniu atletas de mais de sete países. “São conquistas que carregam um significado muito forte, pois mostram minha evolução tanto na técnica quanto na luta”, avalia.
Para alcançar esse nível, a rotina de treinos é intensa. “São três horas de treino diário nas segundas, quartas e sextas, com karatê e musculação. Terças e quintas são voltadas ao funcional e musculação, com foco em força e resistência. Aos finais de semana, corrida para melhorar o fôlego e o desempenho”, detalha. A dedicação exige disciplina, mas Ane já incorporou esse ritmo ao seu dia a dia.
Além dos treinos, ela enfrenta o desafio de ser mulher em um esporte tradicionalmente masculino. “Muitos homens não acreditam no potencial feminino e subestimam nossa capacidade de disputar essa modalidade e conquistar títulos importantes”, relata. Mas ela reforça que isso também a fortalece. Sua trajetória é moldada por exemplos de força e liderança feminina — dentro e fora do esporte.
Entre suas maiores referências estão as treinadoras da Academia Power Fight, Elaine Pedroso e Carolina Fernanda. “Minha maior inspiração dentro do karatê é a minha treinadora Shihan Dai Elaine Pedroso, que é minha base neste esporte. Já a Sensei Carolina tem longa história, já disputou um Campeonato Mundial e é a atleta com mais títulos nacionais”, diz. Ane também cita a mãe como exemplo de empoderamento. “Ela sempre me empoderou a ser quem eu quero ser, defende que lugar de mulher é onde ela quiser e que nós precisamos ter conhecimento sobre defesa pessoal em uma sociedade machista, sexista e violenta”.
Com tanta dedicação, o tempo livre é praticamente inexistente. Ane estuda pela manhã, faz cursinho pré-vestibular à tarde e treina à noite. “Depois dos treinos, volto a me dedicar aos estudos, assim como nos fins de semana”. Mesmo assim, ela encontra espaço para a espiritualidade. Antes das lutas, tem o hábito de rezar. “Costumo rezar o terço da batalha e, ao entrar no tatame, faço o sinal da cruz e peço para Deus me abençoar e proteger a mim e ao meu adversário”.
Seus objetivos são claros: alcançar a faixa preta, disputar um Mundial e inspirar outras meninas. “Acredito que esses sejam os sonhos de todos os atletas. Além disso, quero dar orgulho aos meus treinadores e à minha família”. Para quem está começando, ela deixa um recado direto: “A jornada é de grande valor, repleta de aprendizados que transcendem o tatame. Mestres experientes, especialmente mulheres, deixam um legado de coragem, disciplina e paixão que pode iluminar seus passos”.