Bate-Bola | Da redação | 19/12/2007 18h17

Bate-bola: Yara Helena Yule

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Yara Helena Yule

Profissional de educação física, ela é presidente do Caira (Centro Arco-íris de Reabilitação Alternativa), entidade em Campo Grande, que teve seis atletas medalhistas nos Jogos Parapan-americanos Rio 2007. Em entrevista ao Esporte Ágil, ela falou sobre as dificuldades na promoção da prática do paradesporto, das dificuldades e superações encontradas pelas pessoas que possuem algum tipo de deficiência e sobre a importância da criação de um Centro de Treinamento voltado à pessoa com deficiência, para que o paradesporto brasileiro possa evoluir e continuar a conquistar títulos em competições internacionais.

Esporte Ágil - Como foi a temporada de 2007 para o Caira?
Yara Helena Yule -
Este ano de 2007, para nosso País e também para o Caira foi um ano muito positivo no paradesporto, devido ao Parapan, que foi uma vitrine do trabalho que os clubes e associações desenvolvem. Com o Parapan pudemos demonstrar um pouco da potencialidade deste segmento e o trabalho desenvolvido. Em nossa associação posso dizer que foi um ano feliz, porque tivemos seis atletas (cinco do futebol de sete e uma do atletismo), que voltaram coroados de êxito, mostrando a competência do trabalho desenvolvido, com profissionais qualificados. O que ainda necessitamos e temos buscado é estrutura para atender os deficientes, um centro de treinamento para a pessoa com deficiência, onde possamos atender melhor este segmento da sociedade, um local adequado, com as características necessárias para este atendimento específico.

Esporte Ágil - Que modalidades esportivas são trabalhadas no Caira?
Yara Helena Yule -
Futebol de Sete para paralisados cerebrais, atletismo, basquete, tiro, halterofilismo e tênis (apenas um atleta). As modalidades que são nosso carro-chefe são o futebol de sete e o atletismo.

Esporte Ágil - Haveria que tipo de melhoras com a construção de um centro de treinamento específico para o paradesporto?
Yara Helena Yule -
Treinamos atletas com dardo de bambu, em local inapropriado, e ainda assim conquistamos títulos importantes. O futebol também não possui estrutura, treina em campos emprestados pela comunidade e o basquete chegou ao cúmulo de não podermos treinar por falta de uma quadra. Com tudo isto conseguimos desenvolver de forma amadora o paradesporto, mas imagine se tivéssemos local adequado, equipado, com ainda mais profissionais qualificados. Surgiria até uma nova demanda, maior número de pessoas com deficiência, que praticariam estes esportes para melhoria de qualidade de vida e, conseqüentemente, também o esporte de rendimento. Com um local deste, teríamos um trabalho mais eficaz, mais resultados, poderíamos sonhar mais, conquistar mais.
Mostramos através de resultados que temos competência para atuar na área, temos profissionais qualificados para atuar e temos talentos, os atletas. Gostamos do reconhecimento, do elogio, mas precisamos de atitude, a ação do poder público, de destinar um local para atendermos as pessoas com qualidade, a princípio com qualidade de vida, e numa ordem crescente, par atingir o rendimento, a performance, e a competição, que é também nosso alvo.

Esporte Ágil - O Brasil tem uma boa infra-estrutura para a prática do paradesporto?
Yara Helena Yule -
O Brasil tem talento, bons profissionais e sorte, mas não possui infra-estrutura. Com a estrutura que temos, os resultados são verdadeiros milagres, porquê não temos praticamente estrutura nenhuma. O paradesporto esta num nível onde não podemos mais brincar de criatividade e improvisação, não há mais lugar para amadorismo, senão vai chegar um ponto aonde não vamos mais alcançar as grandes potências. Temos atletas talentosíssimos que dão trabalho lá fora, agora imagina se tivéssemos uma estrutura adequada para desenvolver este trabalho, os resultados seriam bem melhores, não apenas em estrutura, mas em comprometimento. Com uma estrutura voltada para o paradesporto, com preocupação na base, poderemos ir muito longe. Essa é nossa maior cobrança no Estado, o de um centro de atividades físicas para a pessoa com deficiência, que começa com atividades físicas e aqueles que tiverem talento e disposição para o esporte de rendimento, vai desenvolver o alto rendimento. Queremos esse compromisso do poder publico, de atender esta comunidade com igualdade, já que somos minoria, que as pessoas tenham essas condições, de exercerem seus direitos com igualdade.

Esporte Ágil - Com um centro de treinamento como este, estaríamos na vanguarda desta questão?
Yara Helena Yule -
Certamente. Existe um centro de convivência para idosos, diversos parques e praças esportivas para o público em geral. Com um centro de treinamento que atendesse todas as pessoas com deficiência, poderíamos fazer convênios com terapeutas ocupacionais, médicos, dentistas, junto com as Universidades, valendo como estagio para os acadêmicos, isso seria excelente, teria uma grande abrangência, qualificando profissionais e atendendo esta demanda. Poderíamos fazer uma intervenção social muito grande. Nossa parte fazemos há muito tempo, não precisamos mais mostrar os resultados, provar nossa qualidade, pois isto já temos mostrado. O Brasil não obra seus governantes, eleitos por voto direto, mas eles também têm que mostrar trabalho, competência para estarem em seus cargos. Queremos agora a contra-partida do poder público, garantindo a continuidade do paradesporto no Estado e no Brasil.

Esporte Ágil - Qual a importância do paradesporto na vida da pessoa com deficiência, principalmente na questão da auto-estima?
Yara Helena Yule -
A atividade física é benéfica para as pessoas sem deficiências, sendo inserida nas recomendações médicas, em virtude da forma de vida que levamos, agora você imagine para uma pessoa com algum tipo de deficiência... o esporte auxilia esta pessoa que possui algum tipo de comprometimento motor, e é fundamental para o bem estar físico, bem estar emocional, porque quando você esta envolvido com atividade física, você vê respostas, no seu organismo, você aumenta sua potencialidade motora, você vê que aquilo te faz bem, e também te dá o bem estar social, da convivência, com outras pessoas que tenham deficiência mais ou menos graves que a sua; então, você pode descobrir sua potencialidade, aquilo que você pode, aquilo que você vai ousar fazer!
A questão da auto-estima é complicada para todos: está gordo demais, está magro demais, está careca, tem celulite. Imagine uma pessoa que tem uma deficiência visível, imagine a auto-estima dela como deve ficar? Mas a auto-estima tema  ver com o todo, para se ter uma qualidade vida é preciso o bem estar físico, emocional e psicológico. A atividade física é fundamental, a partir do momento em que você experimenta seu corpo, dentro de sua limitação, o atleta se supera e vê um desenvolvimento, ele melhora internamente. Convivendo com pessoas que também experimentam essa melhora, começando a compartilhar essas experiências, você começa a adquirir autoconfiança, você melhora sua auto-estima, começa a querer entrar no mundo novamente, você quer ir a escola, quer arrumar um trabalho, um amor; a pessoa começa a querer viver novamente e esporte é o melhor espelho para que ela enxergue e perceba  e suas potencialidades. Auto-estima é igual a qualidade de vida.

Esporte Ágil - O que você acha do tratamento dado pela mídia ao paradesporto?
Yara Helena Yule -
A mídia deixa a desejar aparecendo só quando surgem os resultados, as medalhas, porquê a primeira medalha acontece quando a pessoa com deficiência decide voltar à vida. A primeira medalha dela é esta e ninguém conhece. Todas as outras medalhas são em conseqüência desta primeira, quando você recupera auto-estima, começa a buscar respostas e soluções para sua vida, partir para escolhas para a melhoria de sua vida. Gostaria que fosse diferente, que toda a mídia  olhasse para estas pessoas em todo o seu potencial e qualidades, só que nossa luta é muito maior, temos que brigar por espaço na tv, vaga no estacionamento, rampa, uma vaga no mercado de trabalho. A imprensa só se preocupa quando batemos os recordes em números, mas estamos no pódio todos os dias, quando conseguimos incluir estas pessoas na sociedade: são mais medalhas, mais pódios!

Esporte Ágil - A questão do patrocínio ao paradesporto ainda é preocupante?
Yara Helena Yule -
Faço um chamado aos empresários e governantes, que eles voltem seus olhares ao paradesporto. Teve algum atleta sul-mato-grossense com medalha no Pan Rio 2007? - apenas o garoto do hipismo, que nem mora mais aqui... no paradesporto, tivemos 10 sul-mato-grossenses medalhistas parapan-americanos, e sobre eles gostaria do olhar da mídia, mas não o olhar piegas, mas um olhar compromissado, do poder publico e da mídia, dos empresários, que não estariam jogando seu dinheiro fora investindo neles, pois existe a Lei de Incentivo ao Esporte. Talvez, a forma física destes não seja a propagada, mas tem dado resultados, são pessoas de extrema competência, pois todos estes títulos não vêm a toa; e eles moram em nosso Estado. Na abertura do Jores (Jogos Recreativos Especiais), estavam os secretários João Rocha (Funesp) e Dirceu Lanzarini (Fundesporte), e os atletas paraolímpicos estavam uniformizados com o agasalho de pódio do Brasil. A tocha passou na mão de cada um deles e perguntei aos secretários se não tinham orgulho de ter em seu estado todos aqueles campeões, se não sentiam mais vontade de investir, de apoiar. Para os que ocupam os cargos nos governos e prefeituras, vocês poderiam se preocupar mais com esta questão, proporcionando um local ideal para o atendimento e treinamento destas pessoas.

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