Bate-Bola | Pedro Nogueira/Da Redação | 07/07/2011 16h49

Bate-Bola: Luiz Pereira

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"O profissional competente transforma guris que estão no limiar da marginalidade, tornando -os cidadãos através do esporte". (Foto: Foto: Pedro Nogueira)

Luiz Pereira

Luiz Pereira é diretor da Escola Estadual 11 de Outubro, localizada no bairro Vila Bonança na Capital. Para ele o esporte é uma das grandes alternativas de se transformar uma criança "que não tem jeito" em um bom aluno. Luiz conversou com o Esporte Ágil sobre esporte e educação.

Esporte Ágil - Como é trabalhado o esporte na EE 11 de Outubro?

Luiz Pereira - Executamos projetos de futsal masculino e feminino, tênis de mesa, xadrez, damas. Temos quatro equipes, a infanto-juvenil, a juvenil, a feminina e a masculina que sempre participam dos campeonatos. Este ano ficamos pela terceira vez em 3° na Copa da Juventude. Temos um nome forte. Jogadores que estudaram aqui despontam para o futebol profissional. O Fabiano, lateral-esquerdo do CENE, jogava e estudava aqui. Somos um celeiro no campo esportivo, temos também um menino que é vice-campeão estadual de tênis de mesa.

EA - Existe algum tipo de apoio financeiro que vocês recebem?

LP - A escola investe, gastamos R$ 6 mil por ano de material esportivo, para poder dar suporte aos alunos. Estou atrás de uma Kombi para não ter que levar os alunos para competir no meu carro ou no de um professor, tem vez que levo oito guris em um Palio, além do aperto, tem a chance de eu ser multado.

Recebemos oitocentos reais por semestre do governo. O resto a gente consegue com verbas do governo federal, com lucro de festas da escola, com nosso próprio dinheiro. Há um esforço muito grande por parte da escola para que esse investimento seja feito.

EA - O senhor vê o esporte como um dos tripés da educação?

LP - Eu vejo o esporte como uma alternativa positiva para a educação e a saúde. Há uma integração, uma interação social entre as crianças, nossos projetos têm essa idéia. Além de esporte, temos a música, estamos com um projeto musical, montamos uma banda, que já foi a melhor banda de escola estadual da cidade, a banda Fênix. Então, o fato de tirar os guris da ociosidade e trazer para escola para atividade extracurriculares é uma forma de educação, que deveria ser feita por todas escolas.

EA - E os alunos gostam?

LP - Os alunos gostam, gostam tanto que se tivesse professor de educação física disponível 24h por dia eles viriam. Eles não perdem um treino, mesmo quando faz frio, quando chove. Nossa quadra não é coberta, era outra coisa que eu pretendo fazer no futuro, ter uma quadra coberta, mas os alunos adoram.

EA - E além do futebol que é o mais querido pela maioria, os projetos de tênis de mesa e xadrez que o senhor disse existirem na escola atraem alunos?

LP - O pessoal que joga xadrez tem certa vocação, é mais quieto, não gosta de futebol. São alunos mais voltados para a parte racional, que normalmente vão bem em matemática. Tênis de mesa também tem atraído bastante gente, deixo a mesa, raquete e bolinha no pátio e os alunos jogam no recreio, ou agora no período de férias, fim das aulas, eles não tem o que fazer, vão lá jogar.

EA - O esporte "salva" alunos aparentemente perdidos nos estudos ou que bagunçam muito, ou isolados da maioria?

LP - Os alunos mais indisciplinados quando são levados para o esporte se disciplinam de forma diferenciada dos alunos já disciplinados. Eles estavam em um patamar de indisciplina desenfreada, chegam na aula de educação física, sofrem um baque grande e mudam radicalmente. Claro que não são todos, de repente tem um que não adianta, continua indisciplinado, mas de modo geral dá resulto, o esporte resolve.

Incluir alunos que dão trabalho na sala de aula ou que não socializam muito é função do educador. Dizer que esse aluno não tem jeito, que é bandido não adianta.  Ninguém nasce bandido. O grande salto e a grande satisfação de um professor é transformar alguém. Ajudar quem é bom não é necessário, é só dar um empurrãozinho e o aluno vai sozinho. O profissional competente transforma guris que estão no limiar da marginalidade e torna-los cidadãos através do esporte. Se não fizermos isso, que trabalho estamos fazendo na educação?

Tenho um caso de um aluno evangélico que só fala de religião, se deixar o tempo todo ele fala de igreja. É muito focado só nisso e esquece os outros lados. Agora ele vai começar no esporte, vamos tentar criar a interação que ele precisa. No esporte é onde o aluno extravasa, onde externa algum sentimento repressivo, o esporte faz essa função também.

EA - E após fazer o aluno interagir com os outros falta fazer ele melhorar o desempenho escolar. Há alguma forma?

LP - De modo geral, quando o aluno é bom no esporte ele é mediano nas aulas, é notório, os que jogam bola muito bem dificilmente são os melhores da sala. Não são os piores, mas estão sempre abaixo da média. A gente percebe que eles dão muita atenção para o esporte e às vezes esquece da escola. Temos que nos preocupar. Para o segundo semestre aqui na 11 de Outubro vamos trabalhar com média. Os alunos que estiverem abaixo da média sofrerão algum tipo de represália, não serão convocados ou não jogarão algum campeonato. E saberão disso, porque você não está jogando? Porque tirou nota baixa, precisa melhor o rendimento escolar. Os alunos são ágeis, rápidos, mais se desconectam, desconcentram com facilidade, temos que ficar atentos, agora, dizer que o esporte atrapalha o aprendizado do aluno é mentira, pelo contrário, avança.

EA - A aula de educação física está banalizada?

LP - Talvez com o decorrer do tempo perdemos uma parte pedagógica no campo da educação física. Hoje temos bons professores, mas professores com a visão distorcida de que jogar uma bola na quadra para as crianças brincarem é fazer educação física. Na minha concepção não é isso não. Tem que ser trabalhada a interação física e mental, dar aula, ensinar. Alguns profissionais estão fazendo com que a educação física seja no futuro uma disciplina até descartável, pois não há comprometimento com o campo pedagógico.

Educação física tem que ser esporte e lazer, mas também saúde e conhecimento. Do que adianta o guri jogar bem e desconhecer as regras do futsal? Isso acontece muito, porque os alunos não estão sendo ensinados. Além da prática tem que existir a teoria.

EA - Além de incentivar o esporte na escola imagino que haja a preocupação no futuro, o esporte no MS é, na sua opinião, bem valorizado?

LP - A função da escola é preparar o indivíduo para a cidadania. Em nível de esporte precisamos dar uma guinada grande, valorizar o esporte. Você vê empresários, pessoas daqui, patrocinando equipes de fora, de outro estado. Ao invés de patrocinarem o nosso futebol, por exemplo. Se focarmos aqui, nos talento que temos e fizermos algo mais voltado para o futuro, teremos nomes até, quem sabe, internacionalmente falando. Temos que investir no que é nosso. Vamos mexer aqui nas nossas crianças, escolas públicas. Muito atleta pratica esporte na escola, cresce e quando sai desiste por não ter incentivo. Estamos desperdiçando talentos. Muitos param por falta de oportunidade, de apoio. O governo nada faz, isso é um absurdo.

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